quarta-feira, 7 de abril de 2010

Guajajaras pedem socorro


Praticamente isolados do mundo. Esta é a melhor definição para a atual situação dos índios da etnia Guajajara, moradores da aldeia Maraçaranduba, situada no povoado Três Bocas, no município de Alto Alegre do Pindaré (340 quilômetros de São Luís). Ainda pintados (ritual cultural que identifica quando a tribo vai para uma guerra) com as marcas da “batalha” de segunda-feira (22), quando interditaram, por cerca de nove horas, um trecho da Estrada de Ferro Carajás, os indígenas estão indignados com a falta de compromisso dos órgãos responsáveis por prestar assistência ao povo.

Atualmente, eles se queixam que estão sem atendimento médico, com educação precária e sem acesso aos povoados mais próximos da tribo. Ontem, uma índia com suspeita de malária há mais de um mês teve que ser transportada de canoa - já que a única estrada que dá acesso à tribo não tem condições de tráfego de veículos - até a cidade mais próxima para conseguir atendimento médico. Os índios afirmam que, caso a situação não mude, vão interditar nos próximos dias a ferrovia da Vale. O bloqueio da estrada prejudica o transporte de matéria-prima e de passageiros nos trens da empresa.

A principal indignação dos guajajaras da aldeia Maraçaranduba é a falta de assistência médica. A enfermaria que foi construída no local pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) está há mais de dois anos sem funcionar. O local onde os índios recebiam o atendimento encontra-se praticamente em ruínas. “Quando alguém adoece aqui tem que contar com a ajuda da natureza para sobreviver. Nós não recebemos uma visita médica há mais de um ano e meio. Índios estão morrendo e ninguém faz nada. A interdição da ferrovia é um grito de socorro. Alguém precisa olhar para esta situação. Temos vários problemas, mas esse é o maior. Estamos cansados de promessas. A Funasa simplesmente nunca mais apareceu aqui”, declarou a cacique, chefe da tribo Marcilene Guajajaras.

Com suspeita de malária, a índia Audilene Guajajaras passou um mês sem atendimento médico. Ontem, ela teve de ser transportada de canoa até o povoado Três Bocas para seguir até a cidade de Alto Alegre do Pindaré, onde tem o posto de saúde mais próximo, com cerca de 15 quilômetros de distância da aldeia. “Vocês estão vendo como nós estamos vivendo. Se não levarmos ela hoje (ontem) para um posto médico, essa índia vai morrer. Os médicos nunca mais passaram por aqui. Temos apenas uma índia que é enfermeira, mas ela não tem nenhum tipo de material para trabalhar”, declarou o terceiro cacique da tribo Antônio Filho, irmão da índia doente.

Convênio – O que contribuiu ainda mais para a interdição da Estrada de Ferro Carajás, segundo o povo indígena, é a falta de repasse da verba de um convênio firmado entre a Vale, a Prefeitura de Alto Alegre do Pindaré e a Fundação Nacional do Índio (Funai), que traria vários benefícios à aldeia, entre eles uma estrada de acesso e a verba para a manutenção das atividades agrícolas, que eles garantem que não chega desde 2008.

“No primeiro mês de 2008, saiu a última parcela desse convênio. De lá para cá, nunca mais recebemos nada. Chega uma hora que não dá mais para agüentar. Tudo complicou. Recebemos a garantia da Vale de que iríamos dialogar com a Funai e a Funasa. Precisamos da estrada que nos foi prometida, mas também precisamos trabalhar para sobreviver. Temos que acertar todos esses pontos. A Vale nos garantiu que a verba foi repassada tanto para a Funai quanto para a Funasa. Então, queremos saber o motivo da verba não chegar aqui. Alguém está nos enganando. Precisamos dialogar”, denunciou a segunda cacique Rosilene.

Os índios explicaram que o convênio entre a Funai e Vale disponibilizava à aldeia cerca de R$ 150 mil por ano, divididos em parcelas bimestrais. A cacique Marcilene Guajajaras explicou que o dinheiro é disponibilizado pelo convênio e os índios escolhem, depois de um consenso geral, em que vão investir a verba.

“Quando nós recebíamos a verba sempre comprávamos coisas que eram para o bem de toda a tribo, mas tudo acabou. A única coisa que nós temos hoje é um pequeno trator, cuja travessia pela estrada é feita por ele, já que quando chove chega a encobrir uma pessoa de tanta lama. Precisamos de motor para as canoas, pois vivemos também da pesca. Caso as autoridades não nos ouçam, nós vamos chamar os índios da etnia Guajá, que também estão sofrendo bastante, e vamos fazer uma manifestação ainda maior, pois assim seremos ouvidos. Já telefonamos, conversamos, mas ninguém leva a sério. Infelizmente, tem que ser assim. Eles não respeitam o povo indígena”, ameaçou.

Escola precária - A escola que fica dentro da tribo Maraçaranduba, que atende apenas crianças do jardim até a quarta série do ensino fundamental, encontra-se em um estado deplorável. As salas de aula não têm condições alguma de higiene. O teto está todo furado, as paredes completamente úmidas, cheias de infiltramento, e a iluminação não existe, pois toda a fiação elétrica do prédio foi deteriorada com o tempo. “Como é que as nossas crianças vão ter algum tipo de educação? Chegou a hora de nós falarmos”, protestou o índio Paulo Guajajara.

Por conta da falta de energia no prédio onde funciona a escola da aldeia, toda a merenda que chega ao local estraga. Os índios possuem um freezer e uma geladeira que estão desligados por falta de energia elétrica. “Nós até recebemos a merenda escolar, mas não tem onde conservar. Tudo estraga. Até temos onde guardar, mas sem energia é difícil. A nossa aldeia precisa de mais assistência”, disse Paulo Guajajara.


Fonte: O Estado e Nativa FM

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