sábado, 26 de dezembro de 2009

Funai encontra Garimpeiros encapuzados que atuam no rio Boia, no Amazonas

Cinco plataformas com dragas mecanizadas operam no Rio Boia.
Funcionários trabalhavam encapuzados, segundo diário.




Cinco balsas de garimpo de ouro estão trabalhando no Rio Boia, afluente do Rio Jutaí, no sudoeste do Amazonas. São dragas mecanizadas, operadas por pelo menos cinco funcionários cada, que puxam o cascalho do leito do rio e jogam em esteiras, criando enormes bancos de areia e desmatando suas margens. O garimpo nessas condições é crime ambiental.

As balsas foram encontradas no dia 20 pela expedição da Frente de Proteção Etnoambiental do Vale do Javari, realizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em parceria com o Centro de Trabalho Indigenista e acompanhada pelo Estado . Cerca de 30 funcionários, não identificados, estavam encapuzados dentro das balsas. O uso do mercúrio, altamente tóxico, é comum para finalizar o processo de extração do ouro. Os primeiros indícios da operação de balsas de garimpo no Rio Boia foram encontrados a 405 quilômetros ao sul da cidade de Jutaí (AM) no dia 11 de dezembro. Bancos de areia recém-formados indicavam que o leito do rio havia sido revolvido pelas dragas.

Subindo o rio em direção à sua nascente, porém, a situação é alarmante. A cerca de 500 quilômetros de Jutaí, balsas com pelo menos 25 metros de comprimento, dois andares, equipadas com braços mecanizados estão desmatando as margens e destruindo o leito do Boia. Nenhuma das lanchas de apoio tem nome registrado, fugindo à regulamentação da Capitania dos Portos.

O estrago feito pelas balsas é visível a partir do espaço. Imagem de satélite feita há um ano pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) já mostrava o surgimento dos bancos de areia. Com a expedição da Frente Etnoambiental, ficou confirmado que os bancos são subproduto do garimpo ilegal. Até mesmo as águas do rio, escuras, mudaram de tonalidade por conta da operação das dragas.

A Marinha, a Polícia Federal e o Ibama já foram informados pelo indigenista Rieli Franciscato, chefe da expedição, sobre a operação do garimpo na região. As três instituições estudam realizar uma ofensiva conjunta para a retirada das balsas, mas não há previsão de início dos trabalhos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Em vez de querer ensinar aos índios, o homem branco deveria ter a humildade para aprender

Rodrigo Lima
Índios Caiapós em São Jorge
Imagens
Crianças krahos
Cantando
kashalpynya
Ava canoeiro 1982
Mulheres indigenas
Para falar do indígena começo com esse pensamento de Orlando Villas Boas.

"Em vez de querer ensinar aos índios, o homem branco deveria ter a humildade para aprender com eles que o velho é o dono da história, o homem é o dono da aldeia e a criança é a dona do mundo".

Na minha pouca convivência com indígenas aprendi lições que me acompanharão sempre: de como o índio sabe conviver com a terra, o meio ambiente e com o próximo.

Embora se diferenciem no modo de falar , pintar o corpo e outros detalhes, os indígenas em todo planeta têm em comum o respeito pela criança, pelo velho e a vivência em grupo onde as decisões são coletivas.

 Indio, quando eles serão reconhecidos como a nação que tem lições para o homem que se diz civilizado e arrasa com a natureza?

O homem branco continua com as ações impensadas contra o índigena e o meio ambiente.
O avanço da tecnologia e o capitalismo a cada dia mais empurram o índio, os bichos para um abismo sem volta.

Todos os dias devem ser lembradas as lições do krahô, do korubo e tantos outros que vivem ainda em pequenos torrões de terra amedrontados com um futuro que está nas mãos do homem branco.

Nada melhor para refletir sobre sua situação com o texto que transcrevo aqui do indigenista Walter Sanches:

"Os índios Avá-Canoeiro, habitantes da região de Serra da Mesa, norte goiano, compõem atualmente uma família de seis pessoas. Eram quatro, quando em julho de 1983 renderam-se aos fazendeiros locais. Perseguidos e dizimados, a sina dessa Etnia coloca hoje seus sobreviventes em circunstância atípica entre os demais e não menos aviltados povos indígenas brasileiros.

Em 1990, quando cheguei para trabalhar no Posto Indígena de Atração Avá-Canoeiro, encontrei-os – quatro adultos e duas crianças – comendo açúcar cristal em panelas de alumínio e bebendo óleo de soja em copos de vidro, deliciados com as recentes descobertas gastronômicas e das quais ainda não haviam assimilado a prudência do uso.

No posto da FUNAI existia um fogão à gás, e as mulheres, não raro, detinham-se diante dele, acariciando o bujão e sonhando ter um igual na “oca”. “Este fogo bonito, bom muito!” - murmuravam diante da chama azul. Iawí, único homem adulto do grupo (o outro era Trumak, seu filho, de 3 anos) sonhava, por sua vez, com uma casa de telhas francesas. “Buriti presta não”, costumava dizer, referindo-se aos telhados regionais feitos com a palha dessa palmeira, que, devido aos novos hábitos alimentares – leia-se sal e açúcar – tornavam-se o esconderijo/criatório escolhido por milhares de baratas infernizando a vida doméstica.

Sua morada, que achávamos por bem continuar chamando de “oca”, não passava de um triste e frágil casebre coberto de folhas de zinco, entulhado de molambos e trastes inúteis, o lixo cultural adquirido da sociedade envolvente, não tendo para eles grande importância e sim para os répteis e insetos que dali faziam seus pontos de proliferação.

Aceitavam como amigos, tutores ou anjos da guarda aqueles que devassavam e depredavam a terra indígena ainda não demarcada. Conviviam amistosamente com caçadores e pescadores vorazes, muitos vindos de longe no faro dos últimos tamanduás, tucanos e jaús, numa matança infernal a que eles, índios, entre a apatia e a perplexidade assistiam calados. Nunca, entretanto, demonstraram disposição para voltar à mata em busca da dignidade, da autonomia e do sossego perdidos; já traziam intransponível dependência da sociedade regional, etnocêntrica e perversa, mesmo assim arvorada em “aculturá-los”.

E fugir, para onde? Onde quer que se escondessem haveria um minério a ser garimpado por estranhos, uma fazenda a ser instalada, estradas ameaçando romper a aldeia, eventos que para eles jamais trouxeram qualquer benefício, e, de concreto, apenas o genocídio.

Como esperar uma reação libertadora daquela Nação mortalmente ferida, reduzida a quatro viventes, havendo travado seus primeiros contatos conosco somente nos anos 80, rendidos e traumatizados por nossa truculência emocional e tecnológica? Cabia-nos, evidentemente, garantir àquele pequeno grupo étnico o máximo de segurança para continuar vivo e conseguir transpor, com a força dos derradeiros resquícios culturais ainda mantidos, os grilhões da nova e sutil emboscada em que vieram a cair, porque o resto fazia parte de um passado cada vez mais remoto.

Hoje, a Terra Avá-Canoeiro, ainda distante da homologação, serve de palco para a festa das hidrelétricas. Terrenos fundamentais para roçados submergiram a imensos lagos artificiais, enquanto longos e perigosos corredores de fios de alta tensão vão multiplicando-se dentro da “reserva”. Tudo sem qualquer ressarcimento efetivo e honesto que busque minimizar tamanha e indesejável interferência no mundo e na vida dos índios atingidos. E eles também sobreviveram a essa realidade, porém, não se reproduziram mais. A quem, de sã consciência, ocorreria deixar para seus filhos uma herança dessas?"




Amigo continuo dizendo:

... durante séculos o homem branco deixou como herança para o indígena uma grande solidão e um futuro incerto

Fonte: overmundo

Texto de sinvaline pinheiro Uruaçu, GO

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

"Como não morrer de causas idiotas"

"A chefe do Departamento de Medicina Legal da Flórida, nos EUA, diz que a maioria das mortes pode ser evitada"



"Muita gente não sabe, mas deixar a janela do carro aberta quando se está em movimento aumenta o risco de danos mais graves em um acidente"

"Nossa dificuldade em manter uma dieta com alimentos ricos em fibras, como as frutas e verduras, nos leva a expor o corpo a perigos desnecessários"

Há 20 anos, a médica americana Jan Garavaglia, 53 anos, decidiu trocar o consultório pelo necrotério
Ela estava cansada de lidar diariamente com pacientes queixosos a sua frente. Apesar de todas as suas recomendações, eles resistiam e não mudavam de estilo de vida. Continuavam fumando, comendo mal, não se exercitavam. "Isso me deixava muito frustrada", diz a médica. Curiosa por natureza, ela decidiu que seria mais fascinante descobrir por que as pessoas morrem. Tornou-se legista, faz hoje mais de mil autópsias por ano e finalmente descobriu o que tanto queria. "Depois de anos trabalhando nessa área, descobri que morremos por causas idiotas", afirma. "São coisas tolas, que podem ser prevenidas, como os pequenos lapsos de atenção ocorridos enquanto dirigimos e falamos ao celular." Chefe do Departamento de Medicina Legal da Flórida, nos Estados Unidos, Jan também é conhecida como Dr. G, nome que adota no programa Medical examiner, exibido diariamente pelo canal Discovery Home & Health. A médica acaba de lançar o livro Como não morrer! (Ed. Prumo), no qual relata casos reais de pessoas que perderam a vida por simples descuidos. Da Flórida, ela falou à ISTOÉ.
ISTOÉ - Quais as lições que a sra. aprendeu nesses anos todos atuando como legista? Jan - Cada caso que investigo sempre me ensina algo. O corpo conta a história de como alguém viveu, morreu e de que forma a morte poderia ter sido evitada.
Durante meus 20 anos como legista, vi que muitas das mortes não precisavam ter acontecido.
ISTOÉ - Por quê? Jan - Porque foram resultado de causas idiotas. Claro que algumas pessoas têm falta de sorte e desenvolvem uma doença ou sofrem um acidente que é totalmente inevitável, mas muitos constroem a sua má sorte. Lembro do caso de um homem de meia-idade com sobrepeso que nunca se preocupara em fazer um check-up. Um dia ele subiu os degraus de seu apartamento com algumas compras na mão e, quando entrou, sentou no sofá e morreu. A autópsia mostrou alterações há muito existentes no seu coração e rins e uma hemorragia no cérebro. Tudo causado por pressão alta, uma doença facilmente tratável que ele julgava não sofrer.
Outro caso do qual me lembro bem foi o de uma senhora que tropeçou no tapete de casa e quebrou o quadril.
Ela morreu dias depois, em decorrência de complicações causadas por essa queda. São dois exemplos clássicos de mortes evitáveis. O senhor, por exemplo, poderia ter ido ao médico ao menos uma vez. Provavelmente teria descoberto a hipertensão. E a senhora deveria ter tirado o tapete, recomendação bastante útil em residência de pessoas mais velhas, mais propensas a quedas.
ISTOÉ - A sra. pode citar outros casos? Jan - Lembro de ter feito uma autópsia em um senhor que foi encontrado morto no quintal de casa. Vi como nossa dieta ocidental, pobre em fibras, havia devastado o cólon (parte final do intestino grosso) daquele homem, causando uma inflamação gravíssima que teve como resultado a sua morte. Nossa dificuldade em enriquecer a alimentação com frutas e verduras nos leva a situações como essa, em que expomos o corpo a perigos desnecessários.
ISTOÉ - Como não morrer prematuramente? Jan - Consigo ver várias maneiras de evitar mortes prematuras exatamente como os outros médicos veem maneiras de prevenir doenças. Como patologista, enxergo muitas coisas que a maioria das pessoas não vê. Nem sempre são os traumas ou as situações dramáticas que matam as pessoas, mas os pequenos lapsos de atenção ou aqueles julgamentos feitos com um milésimo de segundo de atraso. A vida é uma série de escolhas. Somadas à genética e à sorte, elas determinam nosso destino. Você pode controlar o que come, a velocidade com que dirige, pode escolher se vai ou não abusar das drogas ou da bebida. Digo sempre que não sou perita em entender os motivos que levam alguém a usar drogas ou posso não saber como tratar vícios. Mas sei como o álcool e as drogas podem levar alguém à morte.

ISTOÉ - Fazemos escolhas erradas e por isso morremos? Jan - Se você escolhe abusar do álcool, usar drogas e dirigir em alta velocidade, precisa estar consciente de que esses comportamentos podem matá-lo. Do mesmo modo que não cuidar do peso, não fazer atividade física ou alimentar-se mal. São escolhas que você faz conscientemente. Portanto, deveria saber as consequências básicas dessas decisões e no que elas podem resultar. Tomar as decisões corretas pode lhe dar a oportunidade de viver por mais tempo. Não acredito que a diferença entre a vida e a morte seja apenas uma questão de tempo
ISTOÉ - O que as pessoas podem fazer? Jan - É impossível escapar da morte. Mas você pode impedir que ela chegue prematuramente com atitudes simples. Muita gente não sabe, mas deixar a janela do carro aberta quando se está em movimento aumenta o risco de danos mais graves em um acidente. A pessoa pode ser arremessada para fora do carro com mais facilidade. Outros exemplos de boas atitudes são prender corretamente o cinto de segurança ou acelerar menos. Evitar o álcool é outra medida.
Pelo menos 40% das pessoas que morrem no trânsito apresentam álcool no organismo. A distração no trânsito também mata. Para algumas pessoas, o carro é o lugar perfeito para retocar a maquiagem ou falar ao telefone. A falta de atenção no trânsito é responsável por cerca 25% de todos os acidentes nos Estados Unidos. Outros conselhos são fazer mudanças sutis na dieta ou seguir as ordens do seu médico. Também precisamos aprender a ouvir o corpo, não ignorar os sinais que ele dá quando alguma coisa está errada.

ISTOÉ - Isso significa fazer um check- up periodicamente?Jan - Compreendo que algumas pessoas não querem ou não podem pagar uma consulta médica. Mas sou da turma que defende o check-up anual. Mesmo que seja apenas para construir uma boa relação com o seu médico e conversar com ele sobre os cuidados com a saúde. Mas é uma oportunidade para verificar o colesterol, a pressão arterial e o açúcar no sangue. Esses assassinos silenciosos podem matar sem que você nunca tenha se sentido mal. Os primeiros sintomas podem ser fatais. Você terá vida longa se mantiver esses índices em níveis normais.

ISTOÉ - Que outras atitudes podemos adotar? Jan - O que você precisa saber sobre o remédio que o seu médico prescreveu? Muita coisa. Nenhum medicamento é 100% seguro para todo mundo. Mesmo aqueles vendidos sem prescrição médica podem causar efeitos adversos, especialmente se forem tomados de maneira incorreta.
Por exemplo: um único comprimido de aspirina pode resultar em um ataque de asma que ameace a vida de uma pessoa sensível a essa droga.

ISTOÉ - Em geral ocorrem mais mortes por acidentes ou por negligência em relação à saúde?
Jan - Nos Estados Unidos, 40% das mortes ocorrem por doença prematura, ou seja, são previsíveis. Outros 40% são por acidentes, 10% são por suicídios e outros 10% por homicídios.

ISTOÉ - Quem morre mais antes da hora: os homens ou as mulheres? Jan - Os homens. Eles costumam ignorar a saúde e abusar do álcool e das drogas. Além disso, os homens vão muito menos ao médico que as mulheres. Eles reprimem a dor, ignoram os sintomas e negam a doença. Também fazem escolhas estúpidas. Eles dirigem de modo agressivo ou sob influência de entorpecentes e por isso pagam com a própria vida.
Nos Estados Unidos, os acidentes, principalmente os automobilísticos, matam 35 mil homens a cada ano.
O dobro da quantidade de mulheres. Assombrosamente essas mortes ocorrem até os 44 anos.

ISTOÉ - Por que a sra. optou por trabalhar como legista? Jan - Meu professor de química na escola secundária me inspirou a me tornar médica. Mas fiquei desiludida durante a residência e percebi que a medicina não combinava com a minha personalidade. Gostava de compreender o funcionamento do corpo humano e de chegar ao diagnóstico. Mas lidar diretamente com reclamações de pacientes - muitas delas relacionadas com a maneira como eles estavam vivendo - me desgastou.
ISTOÉ - Mas essa realidade não faz parte da rotina do médico? Jan - Trabalhava em uma clínica na qual tratava pessoas que tinham principalmente doenças relacionadas ao estilo de vida, ao hábito de fumar, de não fazer exercícios, ao fato de estarem acima do peso. Ficava frustrada porque, apesar das minhas recomendações, poucos mudavam suas rotinas. Resolvi que seria mais fascinante descobrir por que as pessoas morrem.

ISTOÉ - Como é lidar tão de perto com a morte?Jan - O mundo da morte não é exatamente o que os meus pais imaginaram para mim. Mas amo juntar peças, usar o pensamento criativo e resolver mistérios. A morte nunca me preocupou, na verdade. Eu a vejo como uma parte natural da vida. Eduquei-me dentro dos preceitos da religião católica com um conjunto de valores morais bastante claros. Embora tenham me ensinado que há um céu e um inferno, nunca pensei muito sobre o que acontece conosco depois que morremos. Mas não acredito que passamos por este mundo apenas para terminarmos deitados numa laje. A morte tem muito a nos ensinar.

ISTOÉ - Por isso resolveu escrever o livro? Jan - Ao longo desses anos vivenciei muitas experiências que, tenho certeza, poderão ajudar as pessoas a compreender a sua saúde e a encarar de um novo jeito as consequências das decisões cotidianas que tomam. Assim, poderão cuidar melhor delas mesmas e daqueles que as cercam. Felizmente, percebo que essas ações têm impacto. No meu programa de tevê, o Medical examiner, recebo muitas cartas e comentários de espectadores afirmando que finalmente conseguiram relacionar de maneira concreta como seus comportamentos afetavam sua saúde.

ISTOÉ - E a sra.? Mudou algo na sua vida a partir de sua experiência? Jan - Estar rodeada pela morte me ensinou a viver uma vida mais saudável e feliz. Minha profissão também me ensinou muito sobre as pessoas e a condição humana. Mas a mais fundamental das lições foi sobre como a vida é preciosa.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Orlando Villas Bôas: o encantador de gente

Ele suportou doenças como malária, picadas de insetos e as intempéries do tempo chuva e calor e a falta das comodidades mínimas urbanas para defender os direitos dos índios. "A cultura índigena representa um valor humano essêncial que, também deveria ser protegida".

Conquistar os direitos dos povos em um país cuja meta é o desenvolviemnto econômico, onde existem quadros de desigualdades sociais, talvez não haja no mundo algo muito semelhante aos fatos deste sertanista bem-sucedido no terreno financeiro e profissional. Sua autobiografia, Editora FTD, nos dá sensação de contemplar um monumento à humanidade. Os irmãos Villas Bôas começaram sua trajetória no sertão no período da ditadura Vargas, 1943. Porém, foi três anos antes da ditadura militar que aconteceu o seu maior feito, O Parque Indígena do Xingu, em 1961 criado no governo de pouco mais de seis meses de Jânio Quadros. Juntamente com seus irmãos Leonardo e Cláudio, orlando empenhou-se sem descanço durante seis décadas para mostrar a necessidade de política pública e o inestimável valor dos índios. Foi um trabalho continuado o realizado por ele, como também foram multíplas as qualidades e tarefas. Ele tinha habilidade no tato político, pois sabia que não seria o bastante ter idéias pouco compreendidas. por exemplo, para manter o parque seria preciso preservar fronteiras e vidas, vigiá-las. Era um confronto de interesses graúdos aos índios. Porém, sua firmeza e paciência para contornar situações incômodas, atravessando períodos autoritários e vários partidos políticos não devem ser substimadas. Um outro fato da vida de Orlando, foi o deslumbramento com os povos indígenas; um tipo de vida diferente da nossa, um povo solidário, comunitário, lúdico e artísticos. Tudo isso inserido à natureza e ao que é belo, como ele mesmo disse. Enquanto muitos rejeitaram e condenaram fingiam investigar e mergulhar nos costumes, orlando Villas Bôas, viu alí surgir pouco à pouco de dentro do verde inúmeros povos camuflados, em algumas ocasiões ameaçadores, mas logo mostravam sua grandeza e hospitalidade. Foi onde apaixonou-se por eles, e sua defesa em prol foi visceral, como da própria vida. Ele não se limitou apenas em buscar algo que livros já descreviam; soube lidar com os anseios e reivindicações dos nativos. Etnias fadadas ao desaparecimento no Alto Xingu como Matipu, Nahukwá, Trumai e Tixikão, e no Médio Xingu os Suyá, Juruna e Kayabi todos passaram por processo semelhantes, a proteção de Orlando.

Todos os índios do Xingu são conscientes da importância do trabalho realizado pelo sertanista. Os três irmãos: Orlando, Cláudio e Leonardo mantinham contato com o melhor da antropologia dos meados do século XX, pertenciam a um grupo intelectual raro, e ainda convidavam a participar de suas tarefas colegas como Darcy Ribeiro, e o médico Noel Nutels, este grupo foi responsável pela idéia de que a terra deveria ser preservada, como condição para garantia da vida dos índios. Coube aos Villas Boas, participar da elaboração deste princípio, e defender um mundo de povos desconhecidos. Dos três irmãos Orlando era quem mais circulava pelos meios civilizados, sensibilizando a todos que podia para defender os territórios indígenas. Enquanto isso os outros dois e sua esposa Marina, ficavam a postos para qualquer emergência.

Villas Bôas analfabetos

Ao se alistarem como trabalhador braçal na Fundação Brasil Central, os irmãos eram movidos inicialmente pelo espírito de aventura. Tornaram-se integrantes da Expedição Roncador - Xingu criada em 1943 com doações do governo paulista. Eles fingiram serem analfabetos e como tal foram admitidos. Em seis anos assumiram a chefia e, entregaram à Força Aérea Brasileira a rota que tornou possível ligação direta entre o Rio de Janeiro - Manaus. Tornam-se amigos de Gama Malcher [Serviço de Proteção aos índios] de Darcy Ribeiro, e Noel Nutels, fundador da rede de proteção sanitária da frente indígena, tendo no cume da pirâmide, a figura extraordinária de Cândido Mariano Rondon - o Marechal Rondon. Na cidade de Botucatu [bons ares em tupy] eles eram como qualquer outra criança que brinca, salta o quintal do vizinho para pegar frutas. A rua General Jardim foi sua última morada, mas é o largo em frente ao hospital que Misericórdia Botucatuense deixaram mais saudades. Porem, Orlando nasceu em Santa Cruz do rio Pardo, aos 12 de janeiro de 1914, o filho mais velho de Agnello e Arlinda. Quando tinha seis anos sua família muda-se para São Paulo / capital, acompanhando seu pai que, mesmo não sendo formado em direito, prestara um concurso e passou para o cargo de advogado provisionado, e poderia atuar no juízo da comarca. Orlandou estudou no Colégio Paulista, do afamado professor Rocha Campos, localizado na rua Brigadeiro Luís Antônio, próximo sua casa, na rua Genebra. Durante os meses de junho e julho, ele exercia uma função nada gloriosa, era capitão da "quadrilha" grupos rivais que brigavam, principalmente por causa dos balões. Guardou lembranças também da revolução de 1924, quando estudava no Externato Mattoso, no Largo do Arouche, onde ao passar viu a fachada da escola ser crivada por tiros.

Viagem através do mapa

Porem, com a morte de seu pai em 1940, mantenedor de seu pró-labore, Orlando mudara-se com os irmãos para a rua Teodoro Sampaio, região oeste paulistana, e foi trabalhar na Standard Oil do Brasil. Não deu para se manter por lá, mudara-se novamente, desta vez para uma pensão na rua Bento Freitas - esquina com a Marquês de Itu, região central. Neste período seu irmão Cláudio comprou um mapa do Brasil onde eles costumavam "viajar" todas às noites. A morte de seus pais foi um convite para aquele mundo distante, a Amazônia. Resolveu deixar de maneira brusca seu trabalho; não se despediu de ninguém. Pegou suas malas e rumou para estação, antes passou pelo Hotel Esplanada para falar ao ministro João Alberto, sobre possibilidades de ser incluído entre os contratados da expedição. O ministro disse sim. Pegou o trêm rumo a Uberlândia/MG, e de lá foi para Goiânia. Em uma jardineira seguiu até Goiás Velho, onde estudavam saída para o Araguáia. Os três irmãos remaram 23 dias subindo o rio. Após quase seis meses de caminhada por campos, matas e charcos eles chegaram ao fim da primeira etapa, 1945, chegaram na serra do Roncador. O primeiro contato foi com os índios Kalapalo e em seguída com os Kuikuro, Aweti entre outros. A partir daí toda comunidade indígena sabe da história humanitária de Orlando e seus irmãos. Em 2003, como sempre fazia, convidou os amigos para o Kuarup do Orlando, era a última homenagem dos índios do Parque, pois viria a falecer no dia 12 de dezembro.

Aqui fica minha homenagem a um grande Ser humano: Orlando Villas Bôas.