Índios Caiapós em São Jorge
Para falar do indígena começo com esse pensamento de Orlando Villas Boas. "Em vez de querer ensinar aos índios, o homem branco deveria ter a humildade para aprender com eles que o velho é o dono da história, o homem é o dono da aldeia e a criança é a dona do mundo". Na minha pouca convivência com indígenas aprendi lições que me acompanharão sempre: de como o índio sabe conviver com a terra, o meio ambiente e com o próximo. Embora se diferenciem no modo de falar , pintar o corpo e outros detalhes, os indígenas em todo planeta têm em comum o respeito pela criança, pelo velho e a vivência em grupo onde as decisões são coletivas. Indio, quando eles serão reconhecidos como a nação que tem lições para o homem que se diz civilizado e arrasa com a natureza? O homem branco continua com as ações impensadas contra o índigena e o meio ambiente. O avanço da tecnologia e o capitalismo a cada dia mais empurram o índio, os bichos para um abismo sem volta. Todos os dias devem ser lembradas as lições do krahô, do korubo e tantos outros que vivem ainda em pequenos torrões de terra amedrontados com um futuro que está nas mãos do homem branco. Nada melhor para refletir sobre sua situação com o texto que transcrevo aqui do indigenista Walter Sanches: "Os índios Avá-Canoeiro, habitantes da região de Serra da Mesa, norte goiano, compõem atualmente uma família de seis pessoas. Eram quatro, quando em julho de 1983 renderam-se aos fazendeiros locais. Perseguidos e dizimados, a sina dessa Etnia coloca hoje seus sobreviventes em circunstância atípica entre os demais e não menos aviltados povos indígenas brasileiros. Em 1990, quando cheguei para trabalhar no Posto Indígena de Atração Avá-Canoeiro, encontrei-os – quatro adultos e duas crianças – comendo açúcar cristal em panelas de alumínio e bebendo óleo de soja em copos de vidro, deliciados com as recentes descobertas gastronômicas e das quais ainda não haviam assimilado a prudência do uso. No posto da FUNAI existia um fogão à gás, e as mulheres, não raro, detinham-se diante dele, acariciando o bujão e sonhando ter um igual na “oca”. “Este fogo bonito, bom muito!” - murmuravam diante da chama azul. Iawí, único homem adulto do grupo (o outro era Trumak, seu filho, de 3 anos) sonhava, por sua vez, com uma casa de telhas francesas. “Buriti presta não”, costumava dizer, referindo-se aos telhados regionais feitos com a palha dessa palmeira, que, devido aos novos hábitos alimentares – leia-se sal e açúcar – tornavam-se o esconderijo/criatório escolhido por milhares de baratas infernizando a vida doméstica. Sua morada, que achávamos por bem continuar chamando de “oca”, não passava de um triste e frágil casebre coberto de folhas de zinco, entulhado de molambos e trastes inúteis, o lixo cultural adquirido da sociedade envolvente, não tendo para eles grande importância e sim para os répteis e insetos que dali faziam seus pontos de proliferação. Aceitavam como amigos, tutores ou anjos da guarda aqueles que devassavam e depredavam a terra indígena ainda não demarcada. Conviviam amistosamente com caçadores e pescadores vorazes, muitos vindos de longe no faro dos últimos tamanduás, tucanos e jaús, numa matança infernal a que eles, índios, entre a apatia e a perplexidade assistiam calados. Nunca, entretanto, demonstraram disposição para voltar à mata em busca da dignidade, da autonomia e do sossego perdidos; já traziam intransponível dependência da sociedade regional, etnocêntrica e perversa, mesmo assim arvorada em “aculturá-los”. E fugir, para onde? Onde quer que se escondessem haveria um minério a ser garimpado por estranhos, uma fazenda a ser instalada, estradas ameaçando romper a aldeia, eventos que para eles jamais trouxeram qualquer benefício, e, de concreto, apenas o genocídio. Como esperar uma reação libertadora daquela Nação mortalmente ferida, reduzida a quatro viventes, havendo travado seus primeiros contatos conosco somente nos anos 80, rendidos e traumatizados por nossa truculência emocional e tecnológica? Cabia-nos, evidentemente, garantir àquele pequeno grupo étnico o máximo de segurança para continuar vivo e conseguir transpor, com a força dos derradeiros resquícios culturais ainda mantidos, os grilhões da nova e sutil emboscada em que vieram a cair, porque o resto fazia parte de um passado cada vez mais remoto. Hoje, a Terra Avá-Canoeiro, ainda distante da homologação, serve de palco para a festa das hidrelétricas. Terrenos fundamentais para roçados submergiram a imensos lagos artificiais, enquanto longos e perigosos corredores de fios de alta tensão vão multiplicando-se dentro da “reserva”. Tudo sem qualquer ressarcimento efetivo e honesto que busque minimizar tamanha e indesejável interferência no mundo e na vida dos índios atingidos. E eles também sobreviveram a essa realidade, porém, não se reproduziram mais. A quem, de sã consciência, ocorreria deixar para seus filhos uma herança dessas?" Amigo continuo dizendo: ... durante séculos o homem branco deixou como herança para o indígena uma grande solidão e um futuro incerto |
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