Foto de V_tor Santana
A etnia Desana está localizada na bacia do Uaupés junto a outros 16 grupos indígenas. Eles se autodenominam Umukomasã. Habitam principalmente o Rio Tiquié e seus afluentes Cucura, Umari e Castanha; o Rio Papuri e seus afluentes Turi e Urucu; além de trechos do Rio Uaupés e Negro (inclusive cidades da região). Existem aproximadamente 30 divisões entre os Desana, entre chefes, mestres de cerimônia, rezadores e ajudantes. Os Desana são especialistas em certos tipos de cestos trançados, como apás grandes (balaios com aros internos de cipó) e cumatás. Sua população é estimada em 1531 indígenas.
Línguas
A família lingüística Tukano Oriental engloba pelo menos 16 línguas, dentre as quais o Tukano propriamente dito é a que possui maior número de falantes. Desse modo, o Tukano passou a ser empregado como língua franca, permitindo a comunicação entre povos com línguas paternas bem diferenciadas e, em muitos casos, não compreensíveis entre si. As outras línguas desta família são faladas por populações menores, predominando em regiões mais limitadas. É o caso do Desana em comunidades localizadas no Tiquié, Papuri e afluentes.
Características
Os Tukano compõem um sistema sócio-político flexível, cuja integração se dá através de redes de intercâmbio recíproco envolvendo visitas, trocas, casamentos e rituais. Os Tukano compartilham uma área geográfica contínua e um mesmo modo de vida básico, que inclui a caça e coleta, mas no qual predomina a pesca e a agricultura de coivara, sendo a "mandioca brava" o principal produto. Falam línguas muito próximas no que diz respeito à gramática e ao vocabulário. Esses povos têm ainda estilos de ornamentação corporal semelhantes e, embora as palavras e melodias possam ser diferentes, usam os mesmos instrumentos musicais e a sua música, danças e cantos têm uma base comum.
Os mitos explicam as origens do cosmos, descrevendo um mundo perigoso e indiferenciado, sem limites precisos de tempo e espaço, sem diferença entre gente e animal. As narrativas míticas explicam como os feitos dos primeiros seres geraram as feições da paisagem e como o mundo se tornou paulatinamente seguro para a emergência dos verdadeiros seres humanos. Essas narrativas compartilhadas entre os povos do Uaupés expressam uma compreensão comum do cosmos, do lugar dos seres humanos nele e das relações que deveriam existir entre diferentes povos, bem como entre eles e outros seres. Para eles, O universo é feito de três camadas básicas: céu, terra e "mundo inferior". Cada camada é um mundo em si, com seus seres específicos e podendo ser entendidos tanto em termos abstratos como concretos.
Cada um dos grupos indígenas tem direitos sobre um território específico ou trecho de rio com características e potenciais diferentes. Cada grupo é tradicionalmente associado à produção de artefatos específicos; assim, os Desana fabricam cestos, os Tuyuka canoas etc. Essa produção especializada constitui um aspecto da identidade grupal e mobiliza os cerimoniais de troca que são um dos principais componentes das atividades rituais características da região. Em tais festas, os diferentes grupos se reúnem para dançar, beber caxiri, exibir os seus ornamentos de penas, recitar as linhagens de seus antepassados e trocar os seus produtos.
Os indivíduos tukano pertencem ao grupo de seu pai e falam a sua língua, mas devem se casar com membros de outros grupos, idealmente falantes de outras línguas. Externamente, os grupos são equivalentes, mas distintos; internamente, cada um consiste em um número de clãs hierarquicamente ordenados. Os clãs de mais alto grau tendem a viver em lugares mais favoráveis nas partes mais baixas dos rios, enquanto os clãs de menor grau freqüentemente vivem nas áreas de cabeceiras ou as partes mais altas dos rios. A classificação do clã também tem os seus correlatos rituais: os clãs de posição mais alta, são "chefes" que patrocinam os principais rituais e controlam os ornamentos de dança do grupo e os Yurupari; os clãs de posição mediana são especialistas de danças e cânticos; abaixo deles são os xamãs; e o grau mais baixo é ocupado pelos clãs servos que por vezes são identificados com os semi-nômades Maku que vivem nas zonas interfluviais.
Quando uma mulher se casa, ela deixa a sua maloca natal e vai morar junto com seu marido. Simbolicamente, a maloca reproduz em miniatura o universo e seus habitantes constituem tanto uma réplica quanto um precursor do ideal de organização clânica acima descrita. Seguindo essa lógica, o filho mais velho e irmão maior é geralmente o chefe da maloca, e não raro os seus irmãos menores são dançarinos, cantadores ou xamãs, cujos papéis costumam corresponder à ordem de nascimento. Esses líderes são indivíduos que possuem um grande conhecimento esotérico e se mobilizam para manter e aumentar os bens sagrados de sua maloca, podendo disponibilizar os recursos necessários para patrocinar os rituais. Tais capacidades rituais prestam-se a fortalecer sua posição política.
Os Tukano compartilham uma noção de reencarnação segundo a qual, quando uma pessoa morre, um aspecto de sua alma volta para a "casa de transformação", local de origem do grupo. Depois, a alma volta ao mundo dos vivos encarnada em um recém-nascido que recebe o seu nome. As pessoas recebem o nome de um parente recentemente falecido do lado paterno. Cada grupo possui um conjunto limitado de nomes pessoais que vão sendo retransmitidos a cada geração. O aspecto visível dessas "almas-nomes" são os cocares de penas usados pelos dançarinos, que também são enterrados com os mortos. As mulheres não dão à luz na maloca, mas numa roça no interior da floresta, rio acima e atrás da casa. O recém-nascido é primeiramente lavado no rio e depois levado para dentro da maloca pela porta traseira, a "porta das mulheres". Confinado dentro da casa por cerca de uma semana com seu pai e mãe, ele é então banhado de novo no rio e recebe um nome.
Entre os Tukano, a religião não é concebida como um domínio discreto, mas sim como uma dimensão de todo conhecimento, experiência e prática. Para sobreviver e prosperar, bem como assegurar o bem-estar de si e de sua família, todos os adultos precisam de alguma habilidade para manejar e controlar as forças de criação e destruição que os cercam. Os homens adultos devem conhecer tanto os recursos naturais do território quanto suas propriedades espirituais, combinando afazeres rotineiros com procedimentos rituais, com competência tanto para caçar e pescar quanto para fazer encantações para que a carne e o peixe possam ser comidos com segurança. De modo semelhante, as mulheres devem controlar a esfera material e espiritual de produção e reprodução de suas roças, cozinhas e corpos, como uma totalidade integrada. Na Amazônia, freqüentemente se referem aos especialistas rituais com poderes especiais e acesso a conhecimentos esotéricos como "xamãs".
Para agir com êxito todos os homens adultos devem ser em alguma medida xamãs. Aqueles que são reconhecidos publicamente como tal têm maior conhecimento ritual e uma habilidade especial para "ler" o que está por trás das narrativas sagradas, optando por desenvolver habilidades e conhecimento em favor dos outros, sendo reconhecidos como especialistas. Assim, os "xamãs" são aqueles que se destacam dos demais - mas sempre há outros esperando nos bastidores. Com raras exceções, os especialistas rituais são homens - mas a capacidade das mulheres de menstruar e gerar filhos é considerada como o equivalente feminino ao poder dos homens sobre os ornamentos de penas e os Yurupari. Assim, é possível dizer que se os homens adquiram as suas habilidades xamânicas através da cultura, as mulheres já são "xamãs" por natureza. Não é de se admirar então que, na mitologia tukano, o Povo do Universo, os heróis ancestrais que abrem o caminho para a criação da humanidade, sejam gerados por uma divindade feminina conhecida como "A Velha da Terra" em Tukano e Desana.
O ciclo anual é pontuado por uma série de festas coletivas, cada uma com seus cantos, danças e instrumentos musicais apropriados, que marcam eventos importantes do mundo humano e natural - nascimentos, iniciações, casamentos e mortes, a derrubada e o plantio de roças e a construção de casas, as migrações dos peixes e pássaros, e a disponibilidade de frutas silvestres e outros alimentos colhidos. Essas assembléias rituais são denominadas "casas", termo que significa ao mesmo tempo um evento ritual, um grupo de pessoas e um mundo simbólico. As festas assumem três formas básicas: caxiris (festas de cerveja), dabukuris ou intercâmbio cerimonial, e os ritos de Yurupari envolvendo flautas e trombetes sagrados.
Os rituais envolvendo os instrumentos musicais sagrados de Yurupari são a expressão mais plena da vida religiosa dos índios, pois englobam e sintetizam vários temas-chave: ancestralidade, descendência e identidade grupal, sexo e reprodução, relações entre homens e mulheres, crescimento e amadurecimento, morte, regeneração e integração do ciclo de vida humano com o tempo cósmico. Quando os instrumentos estão juntos e são tocados, o ancestral volta à vida, de modo que aqueles que os tocam assumem as identidades dos ancestrais clânicos e entram em contato direto com seus respectivos pais (originários). Esse processo anula a separação vigente entre passado e presente, mortos e vivos, ancestrais e descendentes, restabelecendo a ordem primordial dos mitos de origem. Os instrumentos Yurupari somente podem ser vistos e manuseados pelos homens adultos.
Há dois tipos de ritual de Yurupari, um evento anual mais sacralizado e elaborado que marca o começo do ano, e o outro realizado periodicamente durante o ano para marcar a maturação de diferentes espécies de frutos de árvores. No segundo, os homens de uma comunidade presenteiam os de uma outra - geralmente os seus irmãos - com grandes quantidades de frutos silvestres, trazendo-os para o interior da casa acompanhados dos sons berrantes dos trombetes enquanto as mulheres e crianças permanecem atrás de telas nos fundos. Ao anoitecer, as telas são removidas e as mulheres voltam a se juntar aos homens. Eles dançam a noite inteira até amanhecer e então distribuem os frutos entre os presentes.
Como na agricultura de coivara, na qual a fertilidade e a vida humana vêm da queima anual da floresta, esse conjunto de mito e ritual significa que vida e morte se sucedem como as estações, que os humanos mortais alcançam a imortalidade através de seus filhos, que a periodicidade das mulheres é como a das estações, que o crescimento dos homens e das árvores resultam de um único processo, e que, no final das contas, a fertilidade dos seres humanos e do cosmos estão interligadas em um grande sistema.
Fonte:Agência de Notícias Cavaleiro de Jorge e Asjor.
Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros
Fonte:Agência de Notícias Cavaleiro de Jorge e Asjor.
Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros