quinta-feira, 8 de abril de 2010

Evolução do desmatamento na Amazônia

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http://360graus.terra.com.br/ecologia/images/w_h/w_h_20060901001253.jpghttp://360graus.terra.com.br/ecologia/images/w_h/w_h_20060901000651.jpgA Amazônia registrou um desmatamento de 185 quilômetros quadrados em fevereiro, um índice 29% superior ao mesmo período de 2009. O Ministério do Meio Ambiente atribuiu o aumento às mudanças meteorológicas, com redução da área coberta de nuvens, o que permite captação melhor das imagens pelo Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter). A expectativa é de que nos próximos meses esses índices possam apresentar ainda uma ligeira elevação. Tanto pela melhora das condições meteorológicas quanto pela chegada do período em que tradicionalmente há aumento da atividade de desmatamento.
http://360graus.terra.com.br/ecologia/images/w_h/w_h_greenpeace02.1.jpgApesar do desempenho registrado em fevereiro, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, disse estar confiante sobre o ritmo de queda de desmatamento no País. Dados do Deter revelam que 1.352 quilômetros quadrados de floresta foram derrubados entre agosto de 2009 e fevereiro de 2010. Um índice 51% menor do registrado no período entre agosto de 2008 e fevereiro de 2009: 2.781 quilômetros quadrados.
Com novos índices agora coletados, a expectativa do Ministério é de que muito rapidamente o País consiga reduzir o desmatamento para a marca de 6,5 mil quilômetros quadrados anuais - algo que estava previsto para ser atingido apenas em 2015.
Em fevereiro, a área de cobertura de nuvens na Amazônia foi de 57%. Nessa região encoberta, o sistema Deter não consegue verificar se houve desmatamento. Em fevereiro de 2009, a área de cobertura de nuvens foi maior, 80%. Dados divulgados hoje mostram ainda que o Deter detectou em janeiro 23 quilômetros de desmatamento. No mês, 69% da área analisada estava coberta por nuvens. Em dezembro, dados não foram divulgados justamente porque toda a área estava encoberta.
LÍGIA FORMENTI - Agência Estado
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Flagrante via satélite    

Image meramente ilustrativa



       
  O desmatamento da Amazônia sempre foi uma vergonha nacional sem rosto. Há duas décadas, quando satélites começaram a cruzar o espaço acima das árvores e fotografar, a cada quinze dias, o panorama da floresta, se sabe que a Amazônia está sendo devorada em grandes nacos. O ritmo da destruição flagrada pelas fotos mostra que por ano, em média, desaparece a cobertura vegetal de uma área equivalente a metade do Estado de Alagoas. São medições muito precisas e inquestionáveis. O levantamento feito do espaço, porém nunca pôde responder à perguntar crucial: quem são os responsáveis pelos focos de destruição? Na semana passada, pela primeira vez desde que a devastação sistemática da província ecológica mais rica do planeta começou a tirar o sono do mundo, as autoridades brasileiras puderam localizar os culpados. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis já tem em mãos o nome dos dez maiores desmatadores do ano passado. "De agora em diante será possível identificar e responsabilizar individualmente os grande agressores da floresta", diz Rodolfo Lobo, chefe do Departamento Nacional de Fiscalização do Ibama. Para fazer esse cadastro dos destruidores da mata, o Ibama teve de cruzar dados de diversas fontes. Foi uma operação em três fases. Na primeira, o Centro de Sensoriamento do órgão analisou as fotos do satélite Landsat e identificou nelas as áreas desmatadas com mais de 1 000 hectares, equivalentes a 1 200 campos de futebol. Como não tiveram acesso integral aos levantamentos mais antigos, os técnicos se fixaram sobre as glebas desmatadas mais recentemente, entre 1997 e 1998. O tamanho de 1 000 hectares foi escolhido porque todo desmatamento dessa dimensão ou maior só pode ser feito com um relatório de impacto no meio ambiente, Rima. A segunda etapa foi sobrepor as fotos do satélite aos mapas locais das regiões onde foram encontradas as áreas desmatadas. Isso permitiu saber em que município estão localizadas as fazendas. A terceira e última foi a fase mais complexa. Com as imagens e mapas na mão os técnicos do Ibama foram a campo descobrir os fazendeiros responsáveis pelo corte ilegal de árvores. A partir dos dados de latitude e longitude das áreas desmatadas, fornecidos pelo cruzamento das fotos de satélite com os mapa locais, os fiscais foram para o corpo- a- corpo. Essa última etapa do levantamento foi acompanhada pelos repórteres de Veja. Equipados com GPS, instrumentos de navegação via satélite, os fiscais checaram cada um dos pontos indicados pelas coordenadas geográficas das fotos feitas do espaço. Só assim foi possível descobrir o nome das fazendas e de seus proprietários.

Amazônia Legal - Institutos

Cananga-do-Japão

Cananga-do-Japão
(Kaempferia rotunda)


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Kaempferia rotunda

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A Cananga-do-Japão (Kaempferia rotunda) também pode ser chamada de Flor-da-Terra, Flor-da-Ressurreição, Lírio-Misterioso, Cananga ou Ilang-ilang-da-Terra. Em espanhol é chamada de Ilang-ilang-de-la-tierra. Em inglês é chamada de Peacock-ginger, Flower-of-the-earth.
É originária da Ásia (Japão), sendo parente do gengibre. É uma planta herbácea que pode chegar a 60 cm de altura. As folhas são matizadas em diferentes tonalidades de verde na parte superior, sendo avermelhadas na parte inferior, formando grupos de folhas unidas na base. A floração é na Primavera e ocorre antes do surgimento das folhas. As flores são levemente perfumadas e lembram orquídeas. A vida da flor é de cerca de um a três dias, mas abrem continuadamente fazendo com que a floração dure mais de um mês.
Prefere ambientes quentes e úmidos e devem ser cultivadas sob sol pleno ou a meia sombra. O cuidado é que o ar que a circunda tenha sempre umidade, pondendo-se tê-la próximo a fontes de água. As regas devem ser moderadas, pois em excesso pode levar ao apodrecimento dos bulbos ou surgimento de fungos.
Se plantadas em um vaso este deve ser baixo, pois quando as flores aparecerem terá uma boa estética. No plantio em vasos deve-se misturar uma parte de terra comum, dois de composto orgânico e uma de terra vegetal. Se plantadas em canteiros, enquanto estiverem com folhas formarão um volume verde quase totalmente vertical, mas deve-se levar em conta o que se plantará ao redor pois as flores ficam mesmo juntas ao solo. O solo deve ser rico em matéria orgânica para que a planta tenha um bom desenvolvimento. Quanto a propriedades medicinais das plantas, seus rizomas são utilizados para tratamentos de pele, triturados ou secos misturado a água formando uma pasta, além de serem acrescentadas outras ervas.
No Inverno a planta entra em um período de dormência que dura até a Primavera seguinte. Neste período de dormência as regas devem ser diminuidas ao mínimo ou mesmo suspensas.
A reprodução é feita pela divisão dos rizomas que devem ser plantados em uma mistura de terra como foi descrito acima.
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http://www.clovegarden.com/ingred/img/gg_galless07e.jpgMembro da família das Zingiberáceas, a Kaempferia rotunda é uma das cerca de 50 espécies que compõem o gênero. Parente do gengibre, ela às vezes é chamada de "peacock ginger" (gengibre-pavão), em razão do colorido de suas folhas. As flores perfumadas lhe rendem outro nome interessante: ilangue-ilangue da terra (ilang-ilang de tierra ou flower of flowers of the earth) - em comparação ao perfume das flores da Cananga odorata (também conhecida como ylang-ylang)
As folhas são graciosas e matizadas. Os pecíolos se juntam fortemente, cobrindo uns aos outros na base, dando a impressão de uma haste. As flores surgem na primavera, antes da brotação das folhas. Além de perfumadas, as flores são vistosas e lembram alguns tipos de orquídeas.
As flores individualmente duram de um a três dias, mas a pouca duração é compensada, pois elas vão se abrindo sucessivamente pelo período de um mês ou mais.
Durante o inverno, a planta entra em dormência. Os rizomas permanecem dormentes sob a terra durante todo este período, armazenando energia e se preparando para "explodir" numa nova brotação na primavera.
Na medicina popular, os rizomas são usados em tratamento de pele. Eles são triturados - frescos ou secos - e misturados com água até formar uma pasta, que pode ser adicionada de outras ervas.
http://imaginacaoativa.files.wordpress.com/2009/09/kaempferia_rotunda_leaves.jpg?w=317&h=423


Folhagem da Kaempferia rotunda
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Ficha da Planta
Nomes populares: Cananga-do-Japão, flor-da-ressureição, lírio-misterioso, ilangue-ilangue da terra
Nome científico: Kaempferia rotunda
Família: Zingiberáceas
Origem: Ásia e Japão
Luminosidade: Luz solar plena e meia-sombra.
Clima: O ideal é o quente e úmido.
Solo: O solo ideal é o rico em matéria orgânica. Em vasos, usar uma mistura de 1 parte de terra comum, 2 partes de composto orgânico e 1 parte de terra vegetal.
Regas: Deve-se regar moderadamente até que a planta entre em dormência. Depois disso, as regas devem ser diminuídas drasticamente.
Floração: Na primavera.
Propagação: Divisão de rizomas.
Características: Planta herbácea, pode atingir cerca de 60 cm de altura. As flores são suavemente perfumadas.
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Por: Rose Aielo Blanco*


cananga02

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Guajajaras pedem socorro


Praticamente isolados do mundo. Esta é a melhor definição para a atual situação dos índios da etnia Guajajara, moradores da aldeia Maraçaranduba, situada no povoado Três Bocas, no município de Alto Alegre do Pindaré (340 quilômetros de São Luís). Ainda pintados (ritual cultural que identifica quando a tribo vai para uma guerra) com as marcas da “batalha” de segunda-feira (22), quando interditaram, por cerca de nove horas, um trecho da Estrada de Ferro Carajás, os indígenas estão indignados com a falta de compromisso dos órgãos responsáveis por prestar assistência ao povo.

Atualmente, eles se queixam que estão sem atendimento médico, com educação precária e sem acesso aos povoados mais próximos da tribo. Ontem, uma índia com suspeita de malária há mais de um mês teve que ser transportada de canoa - já que a única estrada que dá acesso à tribo não tem condições de tráfego de veículos - até a cidade mais próxima para conseguir atendimento médico. Os índios afirmam que, caso a situação não mude, vão interditar nos próximos dias a ferrovia da Vale. O bloqueio da estrada prejudica o transporte de matéria-prima e de passageiros nos trens da empresa.

A principal indignação dos guajajaras da aldeia Maraçaranduba é a falta de assistência médica. A enfermaria que foi construída no local pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) está há mais de dois anos sem funcionar. O local onde os índios recebiam o atendimento encontra-se praticamente em ruínas. “Quando alguém adoece aqui tem que contar com a ajuda da natureza para sobreviver. Nós não recebemos uma visita médica há mais de um ano e meio. Índios estão morrendo e ninguém faz nada. A interdição da ferrovia é um grito de socorro. Alguém precisa olhar para esta situação. Temos vários problemas, mas esse é o maior. Estamos cansados de promessas. A Funasa simplesmente nunca mais apareceu aqui”, declarou a cacique, chefe da tribo Marcilene Guajajaras.

Com suspeita de malária, a índia Audilene Guajajaras passou um mês sem atendimento médico. Ontem, ela teve de ser transportada de canoa até o povoado Três Bocas para seguir até a cidade de Alto Alegre do Pindaré, onde tem o posto de saúde mais próximo, com cerca de 15 quilômetros de distância da aldeia. “Vocês estão vendo como nós estamos vivendo. Se não levarmos ela hoje (ontem) para um posto médico, essa índia vai morrer. Os médicos nunca mais passaram por aqui. Temos apenas uma índia que é enfermeira, mas ela não tem nenhum tipo de material para trabalhar”, declarou o terceiro cacique da tribo Antônio Filho, irmão da índia doente.

Convênio – O que contribuiu ainda mais para a interdição da Estrada de Ferro Carajás, segundo o povo indígena, é a falta de repasse da verba de um convênio firmado entre a Vale, a Prefeitura de Alto Alegre do Pindaré e a Fundação Nacional do Índio (Funai), que traria vários benefícios à aldeia, entre eles uma estrada de acesso e a verba para a manutenção das atividades agrícolas, que eles garantem que não chega desde 2008.

“No primeiro mês de 2008, saiu a última parcela desse convênio. De lá para cá, nunca mais recebemos nada. Chega uma hora que não dá mais para agüentar. Tudo complicou. Recebemos a garantia da Vale de que iríamos dialogar com a Funai e a Funasa. Precisamos da estrada que nos foi prometida, mas também precisamos trabalhar para sobreviver. Temos que acertar todos esses pontos. A Vale nos garantiu que a verba foi repassada tanto para a Funai quanto para a Funasa. Então, queremos saber o motivo da verba não chegar aqui. Alguém está nos enganando. Precisamos dialogar”, denunciou a segunda cacique Rosilene.

Os índios explicaram que o convênio entre a Funai e Vale disponibilizava à aldeia cerca de R$ 150 mil por ano, divididos em parcelas bimestrais. A cacique Marcilene Guajajaras explicou que o dinheiro é disponibilizado pelo convênio e os índios escolhem, depois de um consenso geral, em que vão investir a verba.

“Quando nós recebíamos a verba sempre comprávamos coisas que eram para o bem de toda a tribo, mas tudo acabou. A única coisa que nós temos hoje é um pequeno trator, cuja travessia pela estrada é feita por ele, já que quando chove chega a encobrir uma pessoa de tanta lama. Precisamos de motor para as canoas, pois vivemos também da pesca. Caso as autoridades não nos ouçam, nós vamos chamar os índios da etnia Guajá, que também estão sofrendo bastante, e vamos fazer uma manifestação ainda maior, pois assim seremos ouvidos. Já telefonamos, conversamos, mas ninguém leva a sério. Infelizmente, tem que ser assim. Eles não respeitam o povo indígena”, ameaçou.

Escola precária - A escola que fica dentro da tribo Maraçaranduba, que atende apenas crianças do jardim até a quarta série do ensino fundamental, encontra-se em um estado deplorável. As salas de aula não têm condições alguma de higiene. O teto está todo furado, as paredes completamente úmidas, cheias de infiltramento, e a iluminação não existe, pois toda a fiação elétrica do prédio foi deteriorada com o tempo. “Como é que as nossas crianças vão ter algum tipo de educação? Chegou a hora de nós falarmos”, protestou o índio Paulo Guajajara.

Por conta da falta de energia no prédio onde funciona a escola da aldeia, toda a merenda que chega ao local estraga. Os índios possuem um freezer e uma geladeira que estão desligados por falta de energia elétrica. “Nós até recebemos a merenda escolar, mas não tem onde conservar. Tudo estraga. Até temos onde guardar, mas sem energia é difícil. A nossa aldeia precisa de mais assistência”, disse Paulo Guajajara.


Fonte: O Estado e Nativa FM

segunda-feira, 29 de março de 2010

Idios do Acre da etnia ASHANINKA

ASHANINKA

Vida e Cultura Ashaninka do Alto Juruá na Amazônia
Os Ashaninka têm uma longa história de luta, repelindo os invasores desde a época do Império Incaico até a economia extrativista da borracha do século XIX e, particularmente entre os habitantes do lado brasileiro da fronteira, combatendo a exploração madeireira desde 1980 até hoje. Povo orgulhoso de sua cultura, movido por um sentimento agudo de liberdade, prontos a morrer para defender seu território, os Ashaninka não são simples objetos da história ocidental. É admirável sua capacidade de conciliar costumes e valores tradicionais com idéias e práticas do mundo dos brancos, tais como aquelas ligadas à sustentabilidade socioambiental.
Localização e População

Habitação ashaninka
no alto Juruá.
Foto: Arno Vogel, 1978
A área de ocupação dos Ashaninka estende-se por um vasto território, desde a região do Alto Juruá e da margem direita do rio Envira, em terras brasileiras, até as vertentes da cordilheira andina no Peru, ocupando parte das bacias dos rios Urubamba, Ene, Tambo, Alto Perene, Pachitea, Pichis, Alto Ucayali, e as regiões de Montaña e do Gran Pajonal.
A grande maioria dos Ashaninka vive no Peru. Os grupos situados hoje em território brasileiro são também provenientes do Peru, tendo iniciado a maior parte de suas migrações para o Brasil pressionados pelos caucheiros peruanos no final do século XIX. Aqui os Ashaninka estão em cinco Terras Indígenas distintas e descontínuas, todas situadas na região do Alto Juruá.
Nome e Língua
Os Ashaninka pertencem a família lingüística Aruak (ou Arawak). Eles são o principal componente do conjunto dos Aruak sub-andinos, também composto pelos Matsiguenga, Nomatsiguenga e Yanesha (ou Amuesha). Apesar de existirem diferenças dialectais, os Ashaninka apresentam uma grande homogeneidade cultural e lingüística.
Ao longo da história, os Ashaninka foram identificados sob vários nomes: Ande, Anti, Chuncho, Pilcozone, Tamba, Campari... Todavia, eles são mais conhecidos pelo termo “Campa” ou “Kampa”. Esse nome foi freqüentemente utilizado por antropólogos e missionários para designar os Ashaninka de maneira exclusiva ou os Aruak sub-andinos de forma genérica, com exceção dos Piro e dos Amuesha.
Ashenĩka é a autodenominação do povo e pode ser traduzida como “meus parentes”, “minha gente”, “meu povo”. O termo também designa a categoria de espíritos bons que habitam “no alto” (henoki).
Cosmologia e Xamanismo
Entre os Ashaninka, encontramos as características que definem os sistemas cosmológicos xamânicos presentes nas terras baixas da Amazônia: universo dividido em vários níveis; a existência de um mundo invisível por trás do mundo visível, o papel do xamã como mediador entre esses mundos etc. Talvez a particularidade ashaninka resida na sua concepção extremamente dualista do universo, definindo claramente as fronteiras entre o Bem e o Mal.
Segundo o antropólogo Gerald Weiss, o universo indígena, organizado verticalmente, compreende um número indeterminado de níveis superpostos. Assim, de baixo para cima, encontramos, sucessivamente: Šarinkavéni (o “Inferno”), Kivínti (o primeiro nível subterrâneo), Kamavéni (o mundo terrestre), Menkóri (o mundo das nuvens) e outras camadas que cobrem a terra e compõem o céu (1969: 81-90). O conjunto dos níveis celestes é denominado henóki, mas esse termo também é utilizado como sinônimo de céu, cuja denominação adequada é Inkite.
De acordo com Weiss, mesmo esses níveis sendo inter-relacionados, os moradores de cada um deles experimentam seu mundo de uma maneira sólida. Assim, por exemplo, se tomamos como referência a nossa Terra (Kamavéni), residência dos homens mortais, o céu visível a partir dela constitui apenas o chão do nível imediatamente superior (Menkóri) cuja maior parte permanece fora da nossa percepção visual. Embaixo de Kamavéni, existem dois níveis: Kivínki (-1), residência de “bons espíritos”, e Šarinkavéni (-2) que, segundo o autor, pode ser qualificado como o “Inferno dos Campa”. Weiss salienta, no entanto, que o nível -1 é mencionado por poucos Ashaninka, muitos considerando que, abaixo da terra, só existe Šarinkavéni: o mundo dos demônios.
A cosmologia Ashaninka complica-se quando Weiss identifica os habitantes das diferentes camadas do universo, procurando explicar o papel desempenhado por cada um deles, suas diversas manifestações e suas relações com os Ashaninka. No céu, ou mais especificamente, em cima (henóki), vivem os bons espíritos. Essa categoria é chamada de amacénka e também ašanínka, ou seja, é tomada como extensão da própria autodenominação do povo.
Esses espíritos são hierarquizados conforme o poder que lhes é atribuído e sua importância na cosmologia. Os mais poderosos são denominados Tasórenci e são considerados como verdadeiros deuses. Os Tasórenci têm o poder de transformar tudo através do sopro e formam o panteão ashaninka que criou e governa o universo. No topo dessa hierarquia está Pává (Pawa), o mais poderoso dos Tasórenci, pai de todas as criaturas do universo. Geralmente invisíveis aos olhos humanos, alguns Tasórenci podem, no entanto, aparecer na Terra revestindo-se de forma humana.
Os espíritos do Mal e os demônios, chamados genericamente Kamári, habitam o nível mais inferior, onde vivem sob a autoridade suprema de Koriošpíri. Mas esses espíritos maléficos não residem apenas em Šarinkavéni. Embora essa primeira camada da hierarquia apresente a maior concentração desses seres e abrigue os mais poderosos entre eles, os espíritos nefastos também se encontram, em vários lugares, no mundo habitado pelos homens. Na “nossa” Terra, o principal demônio é Mankóite, que tem sua moradia nas ribanceiras freqüentemente encontradas ao longo dos rios em território ashaninka. Ele se caracteriza por uma forma humana, mas geralmente permanece invisível. Um encontro com ele anuncia a morte. É interessante notar que, segundo Weiss, o Mankóite vive de maneira semelhante ao branco: suas casas têm os mesmos objetos, possuem mercadorias etc.
Assim, a espiritualidade ashaninka apresenta um caráter extremamente dualista. No Cosmos hierarquizado por Pává, os espíritos são, geralmente, bons (amacénka ou ašanínka) ou maus (kamári). Tanto uns como outros manifestam sua presença de diferentes maneiras na Terra habitada pelos humanos. O šeripiari (xamã) atua como mediador entre os homens e essas diferentes camadas do cosmos. Com o auxílio do tabaco, da coca e do kamárampi (ayahuasca), ele procura comunicar-se com os espíritos bons e combater as forças diabólicas, mas também pode dispor seu poder a serviço do Mal (feitiçaria). Dessa forma, o plano em que vivem os homens não é habitado exclusivamente por seres humanos, animais e plantas. Ele apresenta-se como um mundo em equilíbrio frágil, onde os homens vivem constantemente assediados pelo confronto entre o Bem e o Mal. No rio Amônia
Os Ashaninka do rio Amônia também relatam uma visão do mundo construída a partir de uma estrutura do universo verticalmente hierarquizada e composta de camadas superpostas. O nível subterrâneo é associado à morte e aos espíritos do mal: kamari. Os índios pouco falam sobre esse mundo onde moram pessoas estranhas, algumas com um modo de vida semelhante ao do branco (casas, carros...) e que conseguem respirar na água. Os Ashaninka afirmaram que nenhum deles vive lá e que não gostam de pensar nesse lugar perigoso porque poderiam acordar os espíritos maléficos e chamá-los para o nosso mundo. Todos eles afirmam, no entanto, que essa camada existe e situa-se “embaixo” (isawiki) da nossa Terra.
Embora esse mundo esteja associado à morte e tenha sido qualificado por alguns como o “Inferno”, ele não é sempre apresentado como tal. Segundo o relato de Shomõtse, atualmente o Ashaninka mais idoso da aldeia Apiwtxa, o “Inferno” não se situaria nesse nível subterrâneo, mas estaria localizado no céu ou, mais exatamente, “em cima” (henoki), e não “embaixo” (isawiki). Lá existe um “grande buraco com água fervendo numa grande panela”. O dono desse lugar é Totõtsi, cuja principal tarefa é cozinhar os Ashaninka pecadores. A presença do “Inferno” em cima também se encontra em outros relatos, enquanto alguns informantes acreditam que esse lugar esteja situado debaixo da Terra.
Como no caso exposto por Weiss, os Ashaninka do rio Amônia apresentam o céu como composto de várias camadas. No topo, em inkite, encontra-se Pawa, o Deus todo poderoso. Na camada imediatamente inferior, estão os Tasorentsi, que são vistos com características divinas: “eles são como um Deus, pegam qualquer coisa, sopram e transformam em outra coisa”. Num nível abaixo deles, sempre em henoki, encontram-se outros espíritos bons que, como os Tasorentsi, são os “verdadeiros filhos de Deus”. Segundo alguns informantes, essa camada do céu é chamada Pitsitsiroyki. É onde Pawa seleciona entre os Ashaninka aqueles que reconhece como filhos. Segundo os Ashaninka do rio Amônia, esses “espíritos bons” que vivem em henoki podem todos ser considerados como itome Pawa (filhos de Pawa) e são chamados amatxenka ou asheninka.
Para os Ashaninka do rio Amônia, Pawa é apresentado como o Deus criador de todo o universo. Às vezes, os Ashaninka se referem a ele como Paapa (pai). Direta ou indiretamente apoiado pelos seus filhos, ele criou a Terra, a floresta, os rios, os animais, os homens, o céu, as estrelas, o vento, a chuva... Na mitologia nativa, muitas dessas criações são, na realidade, transformações de pessoas ashaninka, filhos de Pawa, em outra coisa e foram realizadas através do sopro. Assim, nos tempos da criação do mundo, os animais, as plantas, os astros ou certos lugares ou fenômenos tinham uma aparência humana e eram, de uma maneira geral, filhos de Pawa. Em função do comportamento desses primeiros Ashaninka na Terra, o Deus e/ou os Tasorentsi transformaram-nos em outra coisa, ruim ou boa. Sol e Lua
Na mitologia ashaninka, o gênero de Sol e Lua são opostos ao português, sendo o primeiro feminino e o segundo masculino. Segundo Weiss, Pawa teria nascido de uma relação sexual de Lua com uma mulher ashaninka que morreu queimada ao dar à luz a Sol. Desse modo, Lua é considerado o pai de Pawa. Antes de subirem ao céu, durante muito tempo Sol e Lua viveram na terra.
Lua ofereceu a mandioca (kaniri) aos Ashaninka que, até aquele momento, só se alimentavam de térmitas. Todavia, apesar de ser o pai de Sol e também considerado como Deus, Lua ocupa um status inferior a Sol em razão de suas atividades que o afastam da vida e o aproximam da morte. Ser canibal, Lua alimenta-se dos mortos e o destino dos Ashaninka é serem devorados por ele.
Essa relação de filiação entre a Lua e o Sol parece um pouco problemática entre os Ashaninka do rio Amônia. Kashiri não é sempre reconhecido como pai de Pawa, na medida em que muitos informantes afirmam, categoricamente, que este sempre existiu e criou tudo, inclusive Lua. Este é visto como um ser ambíguo, ao mesmo tempo considerado como um Deus fornecedor da mandioca (kaniri), mas também associado a um ser canibal que briga periodicamente com Sol (eclipses) e é associado ao mundo dos mortos.
Segundo os Ashaninka do rio Amônia, após a vida na Terra, os mortos (kamikari) vão, num primeiro momento, para o mundo “embaixo” (isawiki), onde permanecem por um tempo. Nas fases de lua nova, Kashiri ingere-os e leva-os para Pitsitsiroyki, onde os entrega a uma estrela. Esta é encarregada de lavá-los, perfumá-los e guardá-los até a visita de Pawa que, periodicamente, vem escolher entre os mortos os Ashaninka que ele reconhece como filhos legítimos e deseja guardar perto de si. Os brancos
Essa hierarquização do Cosmos e a dicotomia entre o Bem e o Mal são fundamentais para entender o lugar atribuído pelos Ashaninka aos “outros” e, principalmente, aos brancos. Toda a organização do Cosmos nativo está baseada nesse princípio estrutural composto por dois elementos ao mesmo tempo opostos e complementares. Assim, enquanto os Ashaninka são idealmente associados ao Bem, o branco mantém laços estreitos com os espíritos maléficos e as forças do mal. A visão do branco (wirakotxa) aparece com destaque na mitologia nativa. O primeiro wirakotxa de que os Ashaninka do rio Amônia afirmam ter conhecimento é o espanhol que surge de um lago, em decorrência de um ato de desobediência do Inka ao seu pai Pawa, e vem perturbar a ordem do universo.
“Antigamente, o wirakotxa morava dentro de um lago. Aí, Inka foi pescar com outro Ashaninka. Era de madrugada. Aí, escutou galinha no fundo e disse: “Rapaz, vamos pegar isso”. “Não precisa não, fica assim mesmo, não vamos mexer não”. No outro dia, a mesma coisa. De novo, ouviu galinha, ouviu cachorro latir no fundo (...). Aí, Inka foi ver Pawa. “Não mexe não, meu filho”. Mas Inka não escutou e foi mariscar [pescar]. Escutava galinha assim bem pertinho, escutava cachorro. “Vou pegar galinha”. Aí, botou anzol com banana, pedaço assim (...) Aí, saiu galinha. Aí, botou de novo, saiu cachorro. Aí, escutou de novo barulho. Pegou banana e saiu Branco. Aí, wirakotxa subiu na Terra. Aí, Pawa ficou brabo e perguntou: “Por que tu foi buscar wirakotxa?”. “Papai, eu fui pegar galinha e wirakotxa saiu”. “Eu não quero esse branco pra cá junto com nós. Eu deixei ele pra lá mas tu gostou dele, agora pode ficar pra tu! Agora, eu vou embora e tu vai ficar com wirakotxa e trabalhar pra ele”. (Alípio, Ashaninka morador do rio Amônia)
O fato de Inka ter pescado a galinha e o cachorro antes do branco é considerado sinal de advertência de Pawa ao seu filho, para que ele interrompesse sua atividade infeliz. Esses animais, trazidos pelo branco, eram desconhecidos dos Ashaninka, que têm um acervo muito variado de mitos para explicar o surgimento da maioria dos animais. Estes eram, inicialmente, Ashaninka que perderam sua aparência humana e foram transformados em animais por Pawa ou pelos Tasorentsi. Todavia, a galinha (txaapa) e o cachorro (otsitsi) nunca foram Ashaninka. Eles surgiram do lago onde eram os fiéis companheiros do branco. Em alguns casos, a comparação com o cachorro foi usada por informantes para qualificar genericamente o branco e/ou seu comportamento: “feio como um cão”, “sovina como cachorro”, “fedorento como cachorro”...
O surgimento do wirakotxa na Terra é portanto o resultado da desobediência do Inka a Pawa, que havia inicialmente separado os Ashaninka dos brancos. Na mitologia indígena, a irresponsabilidade do Inka é mais um exemplo de uma longa lista de erros cometidos pelos filhos de Pawa nos tempos originais. O conjunto desses erros explica a situação atual dos Ashaninka e as imperfeições do seu mundo.
A importância desse evento é reforçada por muitos que consideram que foi em decorrência direta desse ato que o Deus Criador subiu ao céu. Cansado das sucessivas desobediências de seus filhos, Pawa teria decidido deixá-los sozinhos na Terra e morar no céu, onde permanece até hoje, usufruíndo de um mundo perfeito. Outros dizem que Pawa ainda ficou durante um tempo na terra, onde tentou construir um muro para separar os Ashaninka dos brancos.
http://img.socioambiental.org/d/209622-1/ashaninka_2.jpg
De uma maneira geral, a visão que os Ashaninka do rio Amônia constroem do branco pode assemelhar-se à categoria genérica dos espíritos malévolos, kamari. Como eles, o branco é associado à morte e às doenças (matsiarentsi). Os índios acreditam que as doenças são o resultado desses seres nefastos ou da atividade de um xamã maldoso através da feitiçaria. Frente às perigosas e desconhecidas doenças dos brancos (mãtsiari wirakotxa), a sabedoria do sheripiari é ineficaz.
Cultura Material
Os Ashaninka contam que sempre tiveram canoas (pitotsi), casas (pãkotsi) e roçados (owãtsi) com várias qualidades de mandioca (kaniri). Antigamente, as casas eram diferentes, tinham paredes e ficavam diretamente assentadas no chão. Hoje, são construídas sobre pilotis. Embora os brancos regionais também morem em casas elevadas, as dos Ashaninka, geralmente, não têm paredes ou divisões e são cobertas com palha, enquanto os wirakotxa ribeirinhos usam alumínio.
Diferentemente da maioria dos outros grupos indígenas das terras baixas sul-americanas, os Ashaninka sempre usaram roupas. Veste tradicional ashaninka, a kushma constitui um elemento importante na diferenciação étnica. Cabe notar que a palavra “kushma” é de origem quéchua e, embora ela seja também usada pelos índios, os Ashaninka têm o termo “kitharentsi”, que é utilizado para se referir tanto à vestimenta como ao tear e ao tecido.
Foram as filhas de Pawa que ensinaram as mulheres ashaninka a tecer e a fazer a vestimenta. Para os homens, o decote tem uma forma de “V”, enquanto o das mulheres é em “U”. A roupa masculina apresenta listas verticais coloridas, que são obtidas após o tingimento da linha de algodão. Na kushma feminina, as linhas são horizontais. Os motivos realizados a partir dos corantes vegetais também são diferentes. Na túnica dos homens, eles são tecidos e representam detalhes corporais de animais: cara de arara, rabo de bico-de-jaca, características de larvas, pássaros, peixes... Na kushma feminina, os desenhos são pintados e representam pássaros, larvas, peixes e, sobretudo, onças e cobras... Depois de um certo tempo de uso, ambas as vestimentas são tingidas com casca de mogno e lama, o que lhes dá uma cor marrom/preta. A diferença mais significativa entre as duas kushma é que a túnica do homem ainda é realizada tradicionalmente com o algodão (ãpe) tecido no tear, enquanto as mulheres usam tecido industrializado.
O chapéu (amatherentsi) é feito com uma palha de palmeira de cocão (kõtaki) e enfeitado com penas de arara. Se seu uso na Terra Indígena é restrito, mas ao prepararem sua bagagem para as viagens fora da aldeia, as lideranças, junto com a kushma, geralmente, não esquecem o chapéu.
O txoshiki é um tipo de colar confeccionado com várias espécies de sementes nativas. Usados a tiracolo em diagonal, com muitas voltas, eles são, geralmente, enfeitados com adornos (thatane) que caem nas costas. Esses adornos são feitos com sementes, cascas de castanhas ou penas (arara, papagaio, tucano, mutum...). Entre os vários modelos de colares, o kenpiro reproduz os desenhos e as cores da serpente e é considerado o txoshiki original e o mais tradicional pelos Ashaninka.
Entre os instrumentos musicais, os Ashaninka destacam os tambores (tãpo) e a flauta de tipo sõkari. O tambor, de tamanho variável, é feito de madeira de cedro. O tronco é escavado e recoberto dos dois lados com couro de porquinho, queixada ou de várias espécies de macaco (preto, prego, barrigudo...), mais raramente, de arraia. O couro é amarrado à madeira com uma corda de fibra natural (imbaúba). A batida é feita com baquetas confeccionadas em madeira ou com o osso de um macaco, geralmente o fêmur. O sõkari é uma flauta de pã composta por cinco canos de bambu, amarrados com uma corda feita a partir da linha de algodão. O bambu utilizado é de uma espécie que os índios chamam de “shawope” e que vão buscar no Alto Juruá peruano. O sõkari é geralmente tocado pelos homens mais velhos e tem uma simbólica importante. Os informantes contam que ele é usado para homenagear Pawa e se distingue das outras flautas, como o showiretsi ou totama que são tocadas no piyarentsi, simplesmente para dançar.
Rituais

Pintura facial em mulher ashaninka no rio Amônea.
Foto: Mauro Almeida, 1983
Entre os Ashaninka, tanto a bebida feita de ayuaska como o ritual são chamados kamarãpi (vômito, vomitar). A cerimônia é sempre realizada à noite e pode se prolongar até de madrugada. Um Ashaninka pode consumir o chá sozinho, em família ou convidar um grupo de amigos, mas, geralmente, as reuniões são constituídas de grupos pequenos (cinco ou seis pessoas). O kamarãpi se caracteriza pelo respeito e silêncio e contrasta fortemente com a animação festiva do ritual piyarentsi. A comunicação entre os participantes é mínima e apenas os cantos, inspirados pela bebida, vêm romper o silêncio da noite. Contrariamente ao piyarentsi, esses cantos sagrados do kamarãpi não são acompanhados por nenhum instrumento musical.
Eles permitem aos Ashaninka comunicarem-se com os espíritos, agradecerem e homenagearem Pawa.
O kamarãpi é um legado de Pawa, que deixou a bebida para que os Ashaninka adquirissem o conhecimento e aprendessem como se deve viver na Terra. As respostas a todas as perguntas dos homens estão acessíveis com o aprendizado xamânico, que é realizado através do consumo regular e repetitivo da bebida, durante anos. A formação do xamã (sheripiari), no entanto, nunca pode ser considerada como concluída. Se a experiência lhe confere respeito e credibilidade, ele está sempre aprendendo. É através do kamarãpi que o sheripiari realiza suas viagens nos outros mundos e adquire a sabedoria para curar os males e as doenças que afetam a comunidade.
A cura realizada através do kamarãpi é eficaz apenas para as doenças nativas causadas, geralmente, por meio da feitiçaria. Contra as “doenças de branco” os Ashaninka só podem lutar com o auxílio de remédios industrializados.
O piyarentsi, por sua vez, possui uma dimensão mais marcadamente festiva, mas também possui dimensões econômicas, políticas e religiosas. O ritual constitui o principal modo de sociabilidade e de interação social entre os grupos familiares. Nos piyarentsi discute-se de tudo: casamentos, brigas, caçadas, problemas com os brancos, projetos etc.
Em Apiwtxa, a organização de um ou vários piyarentsi ocorre com muita freqüência, geralmente todos os finais de semana. O convite para beber tem o caráter de uma obrigação social e rejeitá-lo é considerado uma ofensa. Após contar com a ajuda do homem para arrancar a mandioca, a mulher é a única responsável pela preparação da bebida.
Descascada, lavada e cozida, a mandioca (kaniri) é posta numa grande gamela (intxatonaki), onde é desmanchada com uma pá de madeira (intxapatari). Uma pequena porção é posta na boca e mastigada até adquirir consistência de pasta, momento em que é jogada na gamela. Este processo se repete com toda a mandioca. A gamela é então recoberta por folhas de bananeira e a massa deixada em fermentação de um a três dias. O convite é feito, geralmente, pelo marido, que passa de casa em casa avisando aos outros chefes de família que haverá piyarentsi.
Todos os Ashaninka da aldeia participam da festa, em que bebem grandes quantidades de piyarentsi. Embriagar-se nessa ocasião é sempre um objetivo e motivo de orgulho. Os homens demonstram sua resistência física, passando dias e noites bebendo, indo de casa em casa, sem dormir. No auge da embriaguez, os Ashaninka tocam suas músicas, dançam, riem. Afirmam que fazem piyarentsi para homenagear Pawa, que se alegra vendo os seus filhos felizes. Foi durante uma reunião de piyarentsi que Pawa reuniu seus filhos, embebedou-os e realizou as grandes transformações antes de deixar a Terra e subir ao céu.
Hoje, se as assembléias comunitárias aparecem como novos rituais gerados pela situação de contato, é ainda no piyarentsi que se fortalece tanto a política interna como externa. Além de conversarem sobre os assuntos do cotidiano da comunidade, no piyarentsi os Ashaninka discutem os projetos e é também aí que tentam conscientizar os parentes recém-chegados do Peru, explicando com orgulho a história da comunidade e sua organização.

- Nomes alternativos: Kampa
Classificação lingüística: Arawak
População: 869 (CPI/Acre - 2004)
Local: Acre (Breu, Amônia e Alto Envira)
Os Ashaninka têm uma longa história de luta, repelindo os invasores desde a época do Império Incaico até a economia extrativista da borracha do século XIX e, particularmente entre os habitantes do lado brasileiro da fronteira, combatendo a exploração madeireira desde 1980 até hoje. Povo orgulhoso de sua cultura, movido por um sentimento agudo de liberdade, prontos a morrer para defender seu território, os Ashaninka não são simples objetos da história ocidental. É admirável sua capacidade de conciliar costumes e valores tradicionais com idéias e práticas do mundo dos brancos, tais como aquelas ligadas à sustentabilidade socioambiental.
Os ashaninkas são hoje, no Acre, a única tribo que possui tecelagem própria. Eles produzem cerca de 150 tipos de peças, como roupas e bolsas artesanais.
Fonte : José Pimenta
Antropólogo, professor substituto do Depto. de Antropologia da UnB e pesquisador associado do IRD
www.socioambiental.org.br

domingo, 28 de março de 2010

Índios temem seca na Volta Grande do rio Xingu, onde hidrelétrica será construída

Para governo federal, população indígena não será diretamente afetada.

Leilão que definirá construtores da usina de Belo Monte será dia 20.Treze famílias de índios maias que vivem na margem da Volta Grande do Xingu, no Pará, temem que a construção da hidrelétrica de Belo Monte reduza o nível da água a ponto de inviabilizar a navegação e a pesca, fonte de alimentação da população.

No projeto da usina, antes da Volta Grande a água será desviada por canais para uma área a ser alagada. Os índios avaliam que, com a mudança no curso do rio, a outra parte - a Volta Grande - deve secar.

Foto: Mariana Oliveira / G1

Tribo maia, na margem do Rio Xingu (Foto: Mariana Oliveira / G1)

O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) - órgão do governo federal que participou das pesquisas para Belo Monte -, Maurício Tolmasquim, afirmou ao G1 que os indígenas não serão diretamente impactados.

"O projeto original previa área inundada de 1,2 mil quilômetros quadrados e a área atual é de 516 quilômetros quadrados. Mudou justamente para evitar impactos sobre as terras indígenas", declarou. Segundo ele, os estudos mostram que a Volta Grande pode ter vazão reduzida, mas não vai secar nem perder a navegabilidade.

O líder indígena José Carlos Arara guarda foto tirada com Lula (Foto: Mariana Oliveira / G1)

Tolmasquim afirmou ainda que os índios foram ouvidos pelo governo durante o processo de audiências públicas com a população. "A grande maioria das comunidades indígenas é favorável [à hidrelétrica]. Tem um grupo de militantes locais contra, mas a massa da população local é favorável. Um grupo atua com a questão ideológica e pretende que [o local] fique intocável, mas não é necessariamente a visão de todos", afirmou o presidente da EPE.

Os índios dizem, porém, que deveriam ter sido feitas audiências específicas para tratar dos interesses das tribos.

Para o líder Leôncio Arara, da tribo maia, se a hidrelétrica for construída, o povo vai "cair em tristeza".

"Se vier a barragem, para mim significa uma crise. O Xingu vai ficar mais baixo, e a gente vai ser prejudicado. Estamos acostumados com essa floresta, essa riqueza. O que vai ser de nós?", questiona. "Essa barragem vai acabar com a gente, vai acabar com tudo."

Leôncio Arara disse que a população indígena está preparada para resistir à força. "Os parentes (outras tribos) falam em mobilização de 5 mil a 10 mil índios para acampar na barragem e daí vão dispostos a tudo para proteger nossa vida", afirmou.

Foto: Mariana Oliveira / G1

Família da tribo maia durante a refeição (Foto: Mariana Oliveira / G1)

O índio Josinei Arara disse que a resistência ocorrerá porque eles precisam navegar no rio para garantir a alimentação da tribo. "A gente vai lutar fortemente contra isso. Estamos dispostos a tudo. Se ficarmos de braço cruzado vai ser pior."

Josélia Arara, 27 anos e mãe de oito filhos, disse que as mulheres também vão ajudar. "Não somente os homens que estão dispostos a qualquer coisa. As mulheres vão ser prejudicadas e ajudarão para o que der e vier. Nós somos mais afetadas. E se as crianças ficarem doentes, como faremos se não tivermos navegabilidade para deixar a tribo?"



José Carlos Arara, teve um encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano passado e guarda em um porta-retrato de sua casa a lembrança daquele dia. "Ele disse que jamais construiria algo que fosse prejudicar alguém e que não iria enfiar caminhão goela abaixo de ninguém, mas infelizmente não é o que parece", afirmou.

Para José Carlos Arara, a tribo está em um "beco sem saída".

"Não tem nenhum documento que diga que seremos afetados, mas está claro que todos os meios de vida serão afetados. E não temos ideia de como será a situação com a qual iremos nos deparar. Para nós, significa uma perda em relação ao meio de vida da população indígena."

Foto: Mariana Oliveira / G1

Índia prepara alimento na aldeia maia (Foto: Mariana Oliveira / G1)

Ribeirinhos
Em uma vila de ribeirinhos na margem do Xingu, a Ilha da Fazenda, território pertencente ao município de Senador José Porfírio, os moradores também dizem temer a seca na Volta Grande.

"Desde o início, eu não acho que vai ser bom porque vai ser uma morte. Um lado vai encher e o outro vai secar. Eu tenho a pesca como sobrevivência e não sei como vai ficar", diz o pescador Miguel Carreiro de Souza, de 52 anos, que tem como função na vila transportar as crianças para a escola em outra vila maior.

Fátima Ribeiro, de 59 anos, tem filhos e netos na ilha. "Para a gente vai ser muito ruim. A gente vive do que planta e colhe e não sabe direito como vai ficar tudo. E as crianças, como vai ser?", pergunta. Ela disse ainda temer que a "fúria" dos índios contra a hidrelétrica acabe prejudicando os ribeirinhos. "A gente se preocupa com violência, essas coisas. A gente só quer ficar aqui em paz."

Foto: Mariana Oliveira / G1

Índia prepara tracajá, espécie de tartaruga (Foto: Mariana Oliveira / G1)


Fonte:globo.com
Mariana Oliveira Do G1, em Altamira